Santieiros, frades, choteiros ou tortulhos (Cabeceiras de Basto)

Maria Arminda Magalhães do lugar de Morgade, em Arco de Baúlhe (Cabeceiras de Basto), a vender santieiros junto à escola EB2,3 do Arco de Baúlhe. 10 de Novembro de 2011.

Sei muito pouco de cogumelos e assusto-me só de pensar que podem ser venenosos. No entanto, no passado dia 10 de Novembro não resisti a tentação e comprei santieiros em Arco de Baúlhe… Sete santieiros custaram cinco euros.
Na estrada que de Arco conduz à auto-estrada, ali pertinho da escola EB2,3, a Senhora Maria Arminda Magalhães, de setenta anos de idade, moradora no lugar de Morgade, na freguesia de Arco de Baúlhe, estava a vender santieiros, também conhecidos por sentieiros, frades, choteiros ou tortulhos.

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O nome santieiros dados a estes cogumelos advém do facto de costumarem brotar por altura dos Santos, ou seja, na proximidade do dia 1 de Novembro, data em que se comemora o Dia de Todos os Santos. Este ano, dado ter sido um ano seco, os santieiros apareceram um pouco mais tarde, tendo estas duas últimas semanas sido pródigas na sua apanha. Várias pessoas com quem falei no concelho de Cabeceiras davam-me conta de os ter apanhado em quantidade e cozinhado.

Um punhado de sentieiros. Riodouro (Cabeceiras de Basto). 17 de Novembro de 2011

Um punhado de sentieiros. Riodouro (Cabeceiras de Basto). 17 de Novembro de 2011

A Senhora Maria Arminda disse-me que o melhor período para os apanhar é os Santos, mas, também costumam aparecer por altura do S. João. As restantes pessoas apontam apenas o mês de Novembro como época própria para a sua colheita.
Estes cogumelos comestíveis, cujo nome científico é macrolepiota procera costumam dar-se em solos húmidos, menos cultivados, junto à copa de árvores, ou nas beiras dos muros. Podem atingir dimensões avantajadas (40 cm de altura), havendo referências a alguns de alturas e diâmetro descomunais.

Santieiro. Cabeceiras de Basto

Informaram-me em Bucos, freguesia de Cabeceiras, que se dão bem em locais onde pastam os cavalos, servindo o seu estrume de fertilizante para os santieiros. Os cogumelos que comprei à Senhora Maria Arminda Magalhães foram arrancados com a raiz, mas segundo me informaram em Bucos deve deixar-se a raiz na terra, pois a partir dela voltarão a nascer mais cogumelos.
Segundo informação de Silvina Dourado os santieiros nunca aparecem isolados mas sim aos pares. Se se encontra um santieiro é certo e sabido que anda outro próximo. Há quem diga que se chama frades, porque, tal como os frades, andam sempre aos pares…

Ilustração de von Albin Schmalfuss, 1897. In http://en.wikipedia.org/wiki/File:Parasol-1.jpg

Para que fique a saber um pouco mais sobre estes cogumelos reproduz-se um desenho dos mesmos, (von Albin Schmalfuss, 1897) e transcreve-se a sua classificação científica.
Reino: Fungi
Filo: Basidiomycota
Classe: Basidiomycetes
Ordem: Agaricales
Família: Lepiotaceae
Género: Macrolepiota
Espécie: Macrolepiota procera

Os santieiros são um petisco muito do agrado dos cabeceirenses e dos seus vizinhos de Vieira do Minho, Montalegre e Celorico de Basto.

Arganel ou anel que possuem todos os santieiros. Conjunto de cinco arganéis. Cabeceiras de Basto

Depois de apanhados devem ser lavados em água corrente, retirado o arganel (que é um pequeno anel que todos possuem), raspados com a ponta da faca, partidos aos pedaços e cozinhados.
O modo mais simples de cozinhar os santieiros é assá-los nas brasas, temperados com umas pedrinhas de sal. Depois de assados é só comê-los. No meio rural esta era a forma mais simples de os degustar, sendo frequentemente comidos fora das refeições e de pé.

Apresenta-se de seguida três receitas de santieiros ou tortulhos, tal como se preparam em casa de Vera Fernandes, natural da freguesia de Refojos, lugar de Cruz do Muro, em Cabeceiras de Basto.

Tortulhos estufados
Ingredientes
Tortulhos
Cebolas
Alho
Chouriço ou entremeada
Colorau doce
Piripiri
Vinho branco ou vinagre
Azeite
Põe-se os tortulhos numa sertã (sem nenhum ingrediente adicional) para que percam a água que trazem. Depois, noutra sertã coloca-se um pouco de azeite, duas cebolas picadas fininhas e alho também picado até que a cebola fique dourada. De seguida juntam-se os tortulhos, o chouriço ou entremeada, e polvilha-se com colorau doce e sal. Acrescenta-se o piripiri e vai-se mexendo de vez em quando. Deixa-se refogar durante 10 a 15 minutos e quando estiver quase pronto adiciona-se um pouco de vinho branco ou vinagre. Mantêm-se em lume brando a apurar durante mais algum tempo. Tira-se do lume e serve-se.

Arroz solto de tortulhos
Ingredientes
Cebola
Alho
Azeite
Tortulhos
Sal
Faz-se o estrugido com cebola, azeite e alho e deixa-se alourar. Acrescentam-se os tortulhos e deixam-se estar até perderem a água que possuem. Acrescenta-se a água desejada para fazer um arroz soltinho e tempera-se de sal. Quando a calda começar a ferver acrescenta-se o arroz, mexe-se e deixa-se cozer.
Nota: Os tortulhos não se querem muito cozidos para que não fiquem moles.

Tortulhos com cebolada
Ingredientes
Cebola
Azeite
Tortulhos
Sal
Piripiri
Aloura-se a cebola com o azeite. Quando estiver alourada juntam-se os tortulhos, acrescenta-se sal e piripiri a gosto e deixam-se fritar durante cerca de dez minutos, mexendo sempre.

Aproveite o tempo frio, a ausência de chuva e vá até terras de Basto colher santieiros. Mas tenha cuidado caso não os saiba distinguir, pois pode apanhar um demónio em vez de um santo!

18 thoughts on “Santieiros, frades, choteiros ou tortulhos (Cabeceiras de Basto)

  1. Hoje mesmo dia 17 de Maio de 2017 pela manhã encontrei dois sentieiros enormes em Gestaçô Baião, portanto já não é só no S. João e nos Santos, penso que tem a ver com o clima.

  2. Pingback: Cogumelo Trametes versicolor | Saberes cruzados

  3. são muito bons, este ano apanhei muitos, sou natural de viera do minho desde muito novo a procura era muito despotada. o blog muito correto e informativo e o retrato real do que se faz na minha região

  4. Hoje fartei-me de os apanhar na minha caminhada diária.Felicíssima quando os avistei,enchi dois sacos.Já em criãça se comiam em casa dos meus pais,grelhados.
    Hoje vim aqui procurar alternativas de confecção e,deparei-me com este belo blog.
    OBRIGADÌSSIMA!

    • vivo numa zona onde ha muitos cogumelos mas como as pessoas nao os conhecem nao os apanham . hoje andei a apanhar os frades …. FIQUEI maravilhada com tantos . sao optimos …. vim tb procurar alternativas de confecçao . muito obrigado .,,,

  5. Pingback: Um ano… | Saberes cruzados

  6. No Alentejo chamam-se pucaras e parabéns pela informação que está bastante completa. Apenas dois comentários:
    -Só se devem comer as macrolepiotas porque algumas lepiotas podem ser venenosas. Portanto comer à confiança mas apenas as grandes.
    – Quando chove muito podem perder as manchas castanhas que apresentam no chapéu e confundirem-se com a amanita faloides um cogumelo altamente venenoso e muito comum no Alentejo.

    • Excelentes informações…não conhecia este cogumelo e ontem aqui na minha zona (Marinha Grande) enquanto fotografava um cavalo no campo, encontrei os tartulhos ou tortulhos…ou santieiros que tb fotografei e postei no meu mural.
      Uma amiga do FB tem estado a dar-me dicas e gentilmente facilitou-me o caminho até aqui…!!
      Obrigada !!
      🙂

  7. Aqui na zona de Gmr chamavam-se tortulhos. Em Aldão, um tia, de nacionalidade belga, ia ao monte apanha-los. Preparava-os, estufando-os. Conhecia-os bem porque comeu muitos e morreu aos 92 com as doenças próprias da idade. Eu nunca comi, não eramos autorizados.

  8. Que delícia os cogumelos frade bem cozinhados!!
    Lembro-me de os ter comido na minha terra de basto com cebolada e lasca de batata salteada.
    Um autentico manjar dos deuses de comer e chorar por mais!!!

  9. Por aqui chamam-se púcaras e fazem-se também com um refogado de alho e azeite salteados e com um pouco de coentros , uma delicia acompanhados com bom pão do Alentejo.

  10. Olá Isabel. Parabéns por estes teus textos. Deixo-te outra hipótese para o seu preparo, que, aliás, faço muitas vezes com os banais – mas existentes em todos os supermercados – champignons. Deixas a cebola fina e alho alourar e qd estiverem douradas juntas os cogumelos. Passados uns minutos, qdo o seu líquido começar a querer diminuir, estão cozinhados. Colocas em cada prato uma fatia grossa de pão de centeio e deitas aquele preparo por cima. Acompanhas com um tinto velho. Eventualmente, no momento em que colocas os cogumelos na sertã, poderás juntarum pouco de presunto aos bocadinhos, de preferência daquele mais seco. Claro que haverá, então, de ter cuidado com o sal que acrescentaste à cebola e cogumelos.

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